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terça-feira, 19 de janeiro de 2010

A TRÁGICA AGONIA DO HAITI

As cenas e os sons do Haiti entram como espadas cegas na alma e no coração da gente. A disputa pela comida e água em cenário devastado, a loucura violenta dos homens, o delírio manso e doce das mulheres, os olhares perplexos, baços e sem rumo, das crianças, fixam-se como fotografias desoladas em molduras fúnebres. Um terremoto rasgou o Haiti, deu-lhe feridas novas, agudas e repulsivas; despertou o mundo para a sua existência. Mas a dor que dilacera o Haiti não é de agora, é de sempre.
A primeira ilha americana pisada por Colombo recebeu o nome de São Domingos (Haiti e República Dominicana), onde os índios foram escravizados para a agricultura e manufatura cerâmica. No início do século XVI, a França ocupou a ilha,
em decorrência da incapacidade espanhola de manter suas colônias. Já não existiam mais índios, dizimados pelo mesmo mal das Américas, as doenças e a brutalidade dos dominadores. A população que seguiu foi basicamente a de escravos, em sua grande maioria, além de piratas e soldados para combatê-los. Foi o braço escravo que tornou o Haiti um dos países mais ricos das Américas, grande produtor de açúcar. A desproporção entre escravos negros e senhores brancos, mediados por negros e mulatos livres, estabeleceu um processo histórico de insurgências, revoluções, enfrentamentos, golpes e contragolpes, enfim uma cultura de instabilidade absoluta, agravada pelo uso das crenças e mitos religiosos, como instrumentos de domínio e terror. O Haiti teve duas independências, ditadores assassinos, intervenções americanas, linchamentos, controle de seu comércio internacional. Na segunda metade do século XX, o Haiti era um território fora do mundo, mergulhado nas trevas intermináveis da roubalheira, da ignorância, do medo dos espíritos e pavor dos tonton macoute, a polícia repressiva dos Duvalier – Papa e Baby.
A história do Haiti é uma história de dor, como um choro permanente interrompido, às vezes, por um soluço seco, sem lágrimas, sem força, sem vida. As feridas novas são as que acordam o mundo para sua existência, mas o Haiti é uma chaga só, crônica.
O mundo que vivemos investiu 14 trilhões de dólares para salvar a economia mundial em 2009. Com dois ou três bilhões reconstroem o Haiti. Com mais um ou dois, o mundo pode construir uma nova Nação sobre os escombros do terremoto e sob a sombra das nossas culpas seculares.




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